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Mais juros, menos crédito: a conta vai parar no prato e no aluguel do brasileiro
Por Henrique Galvani*
Por Rádio Serraria
Publicado em 25/07/2025 11:02
Artigos

O Brasil já é um dos países com maior taxa de juros reais do mundo, e isso por si só é um dos maiores desincentivos ao empreendedorismo e à produção nacional. A Selic em patamares elevados encarece o crédito, inibe o investimento produtivo e gera um ambiente adverso para quem quer tirar projetos do papel.

E agora, como se não bastasse, o governo cogita tributar os rendimentos de instrumentos essenciais para o financiamento do agro e do mercado imobiliário, como LCIs, LCAs, CRIs e CRAs, até então isentos. Uma medida que pode parecer técnica, mas que, na prática, pune quem produz comida, gera moradia e movimenta a economia real.

Esses títulos, isentos há mais de duas décadas, foram criados justamente para viabilizar o crédito privado em setores estratégicos. Retirar essa isenção pode comprometer a oferta de capital, aumentar o custo de produção e impactar diretamente o bolso do consumidor com a alta dos preços dos alimentos e imóveis.

Um risco real de freio no desenvolvimento - A proposta de taxação, atualmente em debate no governo federal, pode desorganizar o sistema de financiamento privado do país. Hoje, as LCAs e LCIs respondem por boa parte da alocação de recursos para o crédito rural e imobiliário, enquanto CRIs e CRAs estruturam operações robustas com prazos longos e impacto direto na economia real.

Os economistas alertam para o risco de fuga de investidores e encarecimento do crédito. O resultado? Menor oferta de recursos para quem mais precisa, e preços mais altos para quem consome.

Plano Safra ainda é insuficiente - Mesmo com o anúncio de R$ 400 bilhões no Plano Safra 2024/25, a demanda por crédito do agro já ultrapassa R$1 trilhão, segundo o Boletim de Finanças Privadas do Agro (MAPA). Isso escancara o óbvio, o crédito público é insuficiente para dar conta das necessidades do setor.

O agro brasileiro, responsável por cerca de 25% do PIB, precisa de múltiplas fontes de financiamento, e os instrumentos privados têm papel complementar e decisivo nessa engrenagem.

O mercado de capitais como alavanca para o agro e o imobiliário - Em 2024, o mercado de capitais brasileiro consolidou seu papel como um dos principais canais de financiamento para os setores agrícola e imobiliário. Segundo dados da ANBIMA, o volume total emitido pelo mercado ultrapassou R$ 783 bilhões, com destaque para os instrumentos de securitização como CRIs, CRAs e FIDCs, que viabilizam a alocação de recursos privados em ativos reais da economia.

O estoque de CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) segue em torno de R$110 bilhões, enquanto os CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) somam mais de R$ 225 bilhões. Já os  FIIs (Fundos Imobiliários) continuam sendo uma das portas de entrada mais populares para o investidor pessoa física, com mais de 2 milhões de cotistas e R$ 200 bilhões em patrimônio líquido.

Outro destaque é o avanço do Fiagro – Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio, criado em 2021. Em 2024, o setor registrou crescimento de 19,6% no patrimônio líquido, que atingiu R$ 41,5 bilhões, consolidando o Fiagro como ponte estratégica entre o investidor de varejo e o agronegócio. As ofertas mensais de novas cotas chegaram a R$ 1,3 bilhão em dezembro de 2024, o maior valor desde o início de 2023, mesmo com uma captação líquida mais moderada ao longo do ano.

Esses dados demonstram que o mercado de capitais tem sido uma alavanca fundamental para financiar o desenvolvimento sustentável e descentralizado do agro e da habitação. São instrumentos que, além de ampliar o acesso ao crédito, reduzem a dependência do Estado e criam alternativas mais eficientes, transparentes e seguras para quem deseja investir com impacto real na economia.

Reação política reforça a importância do crédito privado - A recente decisão do Congresso Nacional de derrubar o veto presidencial e afastar a cobrança de IVA sobre fundos de investimento mostra que há uma preocupação legítima com os impactos que medidas fiscais podem ter sobre o crédito produtivo. A reação política reflete a pressão de setores estratégicos, como o agronegócio, que enxergam nas propostas de tributação um risco real à competitividade e à sustentabilidade financeira do país. O recado é claro, o Brasil não pode inviabilizar seus próprios motores de desenvolvimento.

Por isso, medidas que retiram os incentivos fiscais desses instrumentos — como a proposta de tributação de LCIs, LCAs, CRIs e CRAs — não atacam privilégios, mas sim fragilizam mecanismos já estabelecidos de financiamento da produção.

Isenção não é privilégio — é estratégia - Não faz sentido penalizar os setores que constroem e alimentam o país. A isenção desses títulos nunca foi um “benefício exclusivo”, mas uma política pública inteligente para reduzir o custo de capital em áreas onde o Brasil é protagonista global. 

A reação do Congresso mostra que parte da classe política reconhece a importância de proteger instrumentos que viabilizam o crédito em setores que respondem por uma fatia expressiva do PIB nacional. A tentativa de tributar essas aplicações ignora que os recursos captados por meio de LCI, LCA, CRI e CRA financiam diretamente quem está no campo e nas obras, produzindo com impacto social, econômico e ambiental.

Tributar indiscriminadamente esses instrumentos seria um tiro no pé: aumentaria o custo de produção, desestimularia o investimento privado e pressionaria ainda mais a inflação nos alimentos e na habitação.

Como especialistas em investimentos nas startups do agronegócio, compreendemos que o caminho para o fortalecimento do Brasil passa pela valorização de quem constrói e alimenta o país. Tributar os instrumentos que viabilizam o crédito produtivo significa encarecer a produção, penalizar o consumidor e desincentivar a inovação.

Caminho é estimular, não desestimular - Como especialistas em investimentos nas startups do agronegócio, compreendemos que o caminho para o fortalecimento do Brasil passa pela valorização de quem constrói e alimenta o país. Tributar os instrumentos que viabilizam o crédito produtivo significa encarecer a produção, penalizar o consumidor e desincentivar a inovação.

Defendemos a ampliação do acesso ao mercado de capitais, a valorização das soluções financeiras descentralizadas e a manutenção de políticas públicas que estimulem, e não desincentivem, o investimento em setores produtivos e sustentáveis.

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Henrique Galvani é sócio-fundador e CEO da Arara Seed, primeira plataforma de equity crowdfunding voltada exclusivamente para startups do agronegócio. Formado em Ciências Contábeis pela Universidade Paulista, Galvani atua há 10 anos no setor, com passagens pelo Grupo BLB e pela BLB Ventures. Em 2024, foi reconhecido pela Forbes como um dos talentos do agro na lista Under 30.

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